Nove Meses

Impressões e notas de uma segunda gravidez. Por mamã babada e seu primogénito de dois anos.

A Constança já tem
Lilypie Baby Ticker

6.7.05

Relato de um parto

Faz hoje duas semanas. Já tenho a distância temporal suficiente para escrever sobre o assunto sem me dar vontade de chorar.
Acordei por volta das oito e meia e senti-me sem mais sono. Tomei o pequeno-almoço. Liguei o computador para ver o mail enquanto comia. Sentia-me estranha. Instintivamente percebi que a Constança ia nascer. Umas pequenas dores de barriga. Um corrimento rosa, levemente ensanguentado. Fiquei contente. Provavelmente ainda nesse mesmo dia ia conhecer a minha filhota. Às 9:50 coloquei um post neste mesmo blog a dizer que provavelmente estava a entrar em trabalho de parto.
Estava calmíssima e relaxada. Afinal…era apenas o princípio de um longo processo e tinha ainda tempo para fazer imensas coisas. Entretanto o Henrique acordou, fiz-lhe a papa e dei-lha enquanto ele via o Play House Disney. Percebi que estava com contracções de meia em meia hora. Telefonei para o colégio a avisar que ele não ia. Não me sentia em condições para me meter no carro com ele e conduzir os 15 minutos que nos separam da escola. Às dez horas telefonou-me o papá, que estava a trabalhar desde as 4h30…disse-lhe que estava a chegar a hora, mas que ele não precisava de se stressar, que eu estava bem, ainda devia faltar imenso tempo, e que podia acabar o seu trabalho e sair à hora habitual – 11horas. Às 10h20 telefonou-me a minha mãe…estranhei o telefonema tão cedo, mas ela disse-me que estava preocupada comigo. Quando lhe disse o que se estava a passar ficou em pânico: eu sozinha em casa com uma criança de 3 anos, e em trabalho de parto. Lá descansou quando lhe disse que o R. sairia às 11 horas.
Fui arrumar uma louça que estava por arrumar e estava a varrer o chão da cozinha quando senti uma água quente a escorrer por mim abaixo. As águas tinham rebentado. Eram 11 horas. A partir daí, as contracções ficaram mais fortes e cada vez menos espaçadas. Telefonei ao papá que entretanto estava quase a chegar. Chegou por volta das 11h30. Saímos logo de casa, passámos por casa dos meus pais para deixar o Henrique com o avô e seguimos para o hospital. O caminho parecia interminável. Ainda me lembrei de ligar à minha médica para saber se ela estava de serviço. Estava no consultório mas ia para o hospital à tarde. Pensei que era desta que ela iria assistir ao parto.
Cheguei ao hospital por volta das 12:15. Estava com 4 cm de dilatação e o colo do útero muito mole. A médica da urgência parece ter ficado toda contente por terem finalmente trabalho! Depois percebi que o bloco de partos estava vazio. Por essa altura eu estava já com contracções de minuto a minuto. Percebi que aquilo estava tudo a avançar muito depressa. Insistiram, ainda assim, em me ligar ao estúpido CTG. Eu torcia-me de dores e não suportava estar deitada de barriga para cima. Lá me deitei de lado e ficou mais suportável. Entretanto, senta-se uma enfermeira ao meu lado para me fazer um questionário…perguntas do género: "habilitações escolares minhas e do pai da criança, profissão de ambos, se o meu trabalho implicava esforço". Eu nem queria acreditar. Tentava concentrar-me na dor e em manter-me calma e faziam-me responder àquelas coisas estúpidas. Deixei de responder, concentrei-me em fazer a respiração, e a enfermeira largou-me… Lá se decidiu a levar-me para a sala de partos, não sem antes passar pelo WC para um clister. Por essa altura eu estava realmente com muitas, muitas dores. Tinha tanto calor que me despi e enfiei-me no duche morno. Foi uma sensação fantástica. Fiquei a sentir-me bem melhor. Levaram-me de cadeira de rodas para a sala de partos. Quando eu perguntei quando me iam dar a epidural…senti que ninguém tinha pensado nisso. Fiquei em pânico, e eu não sou de pânicos, mas estava tão aflita que a perspectiva de mais umas cinco ou seis horas de dores daquelas pareceu-me impossível de suportar. A enfermeira disse-me que ia avisar o anestesista, que naquele momento não estava disponível, mas que achava que já não dava para aplicar a epidural. Só me lembro de me tentar preparar psicologicamente para aguentar a dor e concentrar-me na respiração. Naquele momento já não havia sequer intervalos entre contracções, era uma espiral de dores intensas ou muitíssimo intensas e que pareciam não parar nunca. A enfermeira olhava para o CTG e disse-me, isto está a avançar muito rápido. Vão chamar o pai. Deviam ser mais ou menos 13:20. O R. chegou ao pé de mim e eu mal consegui falar. Mas a sensação de o ter ali ao meu lado foi de um alívio imenso. Estava-me a fazer falta um miminho. Acho que ele não estava preparado para me ver daquela maneira. A última vez que tal coisa lhe tinha acontecido, tinha encontrado uma mulher sorridente, conversadora e calma, sob o efeito de uma milagrosa anestesia. Perguntou-me se não estava com epidural…e eu disse-lhe que não sabiam se me iam dar, porque diziam que já não havia tempo. Saltou-lhe a tampa, perguntou à enfermeira onde é que estava o anestesista. A enfermeira só lhe disse que a situação estava a avançar mesmo muito depressa e que possivelmente já não iria ser possível. Decidiu fazer-me novamente o toque (eu acho que devo ter trepado pela cama acima), 6 para 7 centímetros e a avançar muito bem… o comentário "está tão bem posicionado para nascer, está mesmo prontinho, falta pouco", deu-me novo alento e força para continuar calmamente a fazer as benditas respirações sem perder o controle. Claro que o meu conceito de faltar pouco era obviamente diferente do da enfermeira. Eu achava que teria que esperar pelo menos, e sendo optimista, mais uma ou duas horas. Mas…para minha surpresa, não devem ter passado sequer 10 minutos e comecei a sentir uma vontade irresistível de fazer força. A sensação é impressionante. Não foi preciso dizer nada à enfermeira, ela percebeu o que se estava a passar. Novo toque: "10 centímetros, está completa, vai começar a puxar". Foi-me dando instruções de como fazer e eu tentava ir buscar às gavetas da memória aquilo que tinha aprendido há três anos no curso de preparação para o parto. À primeira vez que fiz força ela disse-me que já lhe via a cabeça, com muito cabelo escuro. Mais duas vezes e senti a cabeça a sair. Um alívio indescritível. Mais um bocadinho e saiu o resto do corpo, olhei para o relógio pendurado na parede: 13:40. Puseram-me a minha princesa em cima do peito. Vi-a pela primeira vez. Tão pequenina, tão frágil e tão forte ao mesmo tempo. Demorou a chorar e quando o fez foi mais um leve gemido que um choro. Ao meu lado o pai, que não deixou nunca de me dar a mão (acho que deve ter ficado com uns dedos esmagados), de me dar festas na cabeça e palavras de apoio, estava visivelmente comovido. Afinal tínhamos acabado de assistir a um milagre. Não houve anestesia, nem episiotomia. Foi um verdadeiro parto normal, que se desenrolou por completo em menos de três horas.

Não posso dizer que não custou. Custou imenso, as dores rasam o insuportável. Mas foi apenas um momento. Passou no segundo em que a Constança nasceu e naquele mesmo momento achei que tinha valido mesmo a pena.

Estive duas horas no recobro e lembro-me de pensar que me sentia lindamente. Estava a tremer incontrolavelmente mas sentia que estava mesmo muito bem. A verdade é que passadas seis horas (não me deixaram antes…) levantei-me para tomar um duche e dei por mim a andar normalmente como se nada tivesse acontecido. Amamentei sentada e saía da cama com a maior das facilidades. Foi uma recuperação espectacular que me ajudou a enfrentar com um sorriso as noites sem dormir, a complicada subida do leite e todas as pequenas contrariedades dos primeiros dias.

A enfermeira que assistiu ao parto teve um papel muito importante nesta recuperação, foi avaliando a resistência do períneo para ver se tinha elasticidade suficiente para não rasgar e evitar a episiotomia. Graças a esse simples gesto foi possível não ter que suportar aqueles pontos horríveis, e tantas vezes desnecessários, que tanto desconforto provocam. Percebi instintivamente que era graças ao profissionalismo e bom senso daquela mulher que tudo tinha corrido tão bem. Felizmente ainda lhe consegui dizer obrigada, antes de me levarem para o quarto.

16 Comments:

At 9:47 da tarde, Blogger . said...

Não me canso de dizer, muitos muitos parabéns, pela Constança e principalmente pela tua calma e força. Bjs

 
At 10:40 da tarde, Blogger Anabela said...

Olá Su
só consigo dizer que foste muito corajosa por manteres a calma e o controlo.
Imagino a tua emoção ao teres a tua Constança no teu peito.
Um beijinho grande para vocês

 
At 11:57 da tarde, Blogger LP said...

Olá,
Esse parto foi muito parecido com o meu do João. Rápido, sem anestesia e sem corte. Dói, claro que dói mas a recuperação é excelente.
Beijinhos

 
At 1:44 da manhã, Blogger lénia rufino said...

e pronto... puseste-me a chorar... parabéns pela constança! e felicidades para os quatro... beijinhos!

 
At 10:17 da manhã, Blogger Diana Bento said...

Bem, também eu estou com as lágrimas nos olhos e toda arrepiada. Parabéns!

 
At 1:59 da tarde, Anonymous Anónimo said...

:) olá... estou a ler o blog pela primeira vez... mas não consegui deixar de soltar as lágrimas... que lindo... ainda bem que correu tudo bem...
:) espero que daqui para a frente, este novo capitulo te traga todos os dias mais e mais alegrias...
beijinhos grandes,,,

 
At 4:03 da tarde, Blogger sandra said...

Que maravilha! :)

 
At 10:45 da tarde, Blogger Tânia said...

Mais uma que teve de recorrer aos Kleenex!!!!
Muitos PARABÉNS!!!
Essa recuperação soa-me muito bem. Acho que só comecei a amamentar a Inês sentada ao fim de um mês... nem me quero lembrar :(

 
At 11:51 da tarde, Blogger Jolie said...

O que eu gostei de ler este relato!

Dou-te os meus parabéns a ti pela força e a essa enfermeira que te acompanhou!

São estas "pequenas" coisas que podem fazer uma diferença enorme no pós-parto.

Beijinhos
Sandra

 
At 9:22 da manhã, Blogger Tia Moky said...

Olá!

Que relato tão bonito!! Ainda bem que correu tudo bem!!
Quero muito que o meu corra assim tão bem!! Fico feliz de teres tido a enfermeira ao teu lado!

Tudo de bom para vocês!!

Beijos Tia Moky

 
At 11:47 da manhã, Blogger Ana Rangel said...

És uma grande mulher! :)

Adorei este relato e, como vem sendo comum nos últimos dias, fartei-me de chorar... é isso que conforta, que me faz não temer o parto, o saber que tudo vale a pena!

Mil beijinhos para vocês!

 
At 11:34 da tarde, Blogger ni said...

Que relato tão bonito! Obg por esta partilha maravilhosa!
:o)
Beijos e abraços

 
At 1:16 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Olá, acho q nunca falamos, sinceramente nem sei como aqui vim parar...mas deixaste-me de lágrimas nos olhos, parece q estava lá ctg...mtoooos parabéns e felicidades
Carina e Rodrigo (10 meses)

 
At 9:03 da manhã, Blogger Cláudia said...

Mais um ponto comum entre nós, querida Su: quando o Quique nasceu, e por ter sido tão rápido e ter corrido tão bem, também quis dar um beijo de agradecimento à parteira que me assistiu. Foi a minha Luz (era esse o nome dela).
Beijinhos mimados para ti e para a tua bebé linda, que hoje já cumpre 3 semanas. :o)

 
At 4:26 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Claro que estou a tentar reprimir as lágrimas, a emoção é tanta ao ler o teu relato que o meu bebe de 26 semanas deu uns pontapés cá dentro. :) Parabéns e desejo que encares todos os momentos da vida como encaraste o parto! É realmente um momento único, e relembrei novamente o do meu filho com 5 anos... que foi igualmente lindo, apesar de ter ganho "um andar novo" durante uns bons dias.. a dor é realmente horrível, mas tão bela quando vemos o nosso filho saudável, o nosso milagre.
Agora estou curiosa para saber como se tem portado o irmão à chegada da Constança! :)
Desejo as maiores felicidades para vocês... brevemente também seremos 4 lá em casa!

 
At 5:07 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Parabéns!!!!
Estou grávida de 22 semanas e apesar de o parto ainda estar longe , já me começo a preocupar e o teu relato foi muito esclarecedor e emotivo .
Parabéns a ti e á Contança.
Felicidades

 

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